domingo, 18 de abril de 2010

African time

Em muitos lugares de África a relação com o tempo é… particular. Todos sabemos e todos dizemos: “o tempo é o que fazemos dele”. Sim, mas poucos o sentimos, a verdade é que para a maioria o tempo é ditador, no relógio, no despertador, na rádio, no djob, em casa…
Estou em África, sentada à porta do gabinete do oficial Swahili.
Está calor, estamos na estacão das chuvas curtas, chove e faz sol, todos os dias, várias vezes.
Eu estou aqui, sentada neste banco de pau, e espero, à chuva e ao sol. Molho-me e seco-me. Espero.
Para mim o oficial está atrasado, muito. Mas isso só existe na minha cabeça.
Está atrasado duas horas e para mim isto não se faz, não é profissional, é falta de respeito, etc, etc, etc. Mas isso é para mim, alheia ainda aos valores do momento.
Passaram uma hora, duas horas, quase três horas de tempo… horas “de tempo”… hum… eu pergunto-me de que poderiam ser feitas as horas senão de tempo… eu impaciento-me. Não consigo fazer nada. Porquê? Porque espero.
Finalmente ele aparece, vestido na sua túnica africana, eu levanto-me de imediato, estou furiosa e preparo-me para o descarregar no culpado.
Mas esta não é a verdade, agora sei, o culpado não é ele, sou eu.
Ele pára na entrada e conversa com o guarda, pergunta sobre o dia, a chuva, a família, as frutas da época. Não me olha, encosta-se por um momento na parede, descalça os sapatos, volta a calçar-se, avança, eu avanço de mão esticada, ele não me cumprimenta:
- Já viu estas flores aqui, como estão bonitas? – esta apanha-me de surpresa,
- … Flores?
- Sim, estas flores são muito raras e só aparecem nesta altura do ano… - a verdade é que nem oiço,
- Sim. Senhor Makwakwa eu estou aqui porque precisávamos de falar sobre…
- Hum… é estranho normalmente nestes dias eu gosto de ficar a olhá-las…
- Sim, ok. Bom, a situação é que… - não me deixa continuar,
- Como esteve aqui todo este tempo pensei que tivesse aproveitado para contemplar – e enquanto abre a porta do gabinete completa – é muito importante o tempo para a contemplação sabe?
Eu sigo-o para dentro do escritório, ele senta-se atrás da secretária, entra uma mulher com uma criança pequena que ele toma no colo, fala com ela em língua local que eu não conheço, e só depois olha para mim:
- Sabe, Dona?...
- Joana.
- Mullher de…?
- Não sou casada.
- Mãe de…?
- Não tenho filhos.
- Lamento muito. Mas Ok… Joana. Então, sabe que… - acende uma cigarrilha – eu gosto de contar uma piada engraçada, é só uma piada percebe? Gosta de piadas?
- Sim, mas eu vim aqui…
- Quando deus criou o homem branco deu-lhe um relógio, quando criou o homem negro deu-lhe tempo…

2 comentários:

  1. Apetece-me dizer:
    "Só os que cultivam a preguiça tem a paz de espírito necessária para o florescer de boas ideias".

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  2. Duas palavras apenas: Muito bom!! Grata por partilhar estórias...

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